Conjunto Ceará Periférico
O bairro é um território único na cidade, suas paisagens, moradias, traçados das ruas, os anseios de seus moradores, fixos ou não e as formas como se sentem ou não como partícipes na construção desse espaço. A diferenciação da paisagem urbana seguirá o binômio utilidade/necessidade de seus moradores, assim como os modos de vida, suas semelhanças e diferenciações com o restante da cidade. Esse agrupamento de pessoas, sua união e seus laços estabelecidos e expressados na origem e destinos comuns que corroboram com a dinâmica populacional na ocupação e formação deste território, o bairro, bem como no fomento às singularidades identitárias com o espaço habitado e as diferenças sociais.
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VER O CONJUNTO CEARÁ
Quando se diz "ver o Conjunto Ceará", não é só a atitude de percebemos o local, através do sentido da visão. Existem muitas coisas para além do que nossos olhos captam. O Conjunto é múltiplo, colorido, rico de sentidos, cores e formas. Há, portanto, a necessidade de ver, compreender e significar o amontoado de fatores, que compõe a complexa atmosfera do bairro. A identidade e imaginário do lugar são campos em disputa entre as pessoas que vivem, as que apenas veem — e aquelas que nem isso, mas ainda assim possuem uma imagem do Conjunto Ceará em suas cabeças. Demonstrar a visão do bairro, pelos que nela vivem ajudará a conceitos mais próximos da realidade.
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MORAR NA PERIFERIA DE FORTALEZA
Morar afastado do centro urbano, é sentir o reflexo da desigualdade social do país. Essa distância prejudica a vida de muita gente. É preciso conseguir conciliar os estudos com trabalho, e coloca na conta também o tempo perdido entre os lugares. Imagina: acordar, ir trabalhar longe, depois se locomover de novo até o local de estudo e por último voltar para casa. Muitos passam horas se transportando em vez de se dedicar a qualquer outra coisa, como descansar, criar, estudar e até mesmo ficar com a família.
Assim disse um grande escritor brasileiro “o sertanejo é antes de tudo é um forte” ao falar do povo nordestino, que construiu uma comunidade, em pleno sertão, longe dos grandes centros, por falta de terras melhores, que buscou direitos sociais, embora tudo contrariasse o objetivo.
Quem mora no Conjunto Ceará tem que ser forte e, além, ser persistente e ter fé, pois, diferente de alguém que mora em um bairro tido como de “rico”, tem que lutar contra o preconceito geográfico, as distâncias, o transporte precário, as vias de acesso tortuosas.
Parece que tudo feito para sugar a energia do trabalhador, do estudante e de quem tá correndo para sobreviver, mas desistir não é uma opção, não pelo menos para um povo que tá correndo e sabe que vai chegar. Se estiver pensando em desistir, não faça isso, se inspire nos periféricos, que você não está sozinho.
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A força da sonoridade da periferia é inquestionável. A música alta é uma característica quase que natural quando do final de semana. Há uma sobreposição de músicas, que vêm de casas diferentes. Funk, forró, eletrônica, pop, gospel, de tudo.
A vida na periferia não se limita ao espaço doméstico. O conviver com os vizinhos é regra de uma comunidade, principalmente no início das manhãs e no fins das tardes, daí ouvir-se muitas vozes e risos, brincadeiras, comentários, provocações, principalmente sobre os resultados do futebol.
O ruído do trânsito aumenta ou diminui conforme o horário. Sirenes são raras, a mais expressiva é a dos bombeiros. A buzina das motos de entregadores preenche o silêncio das ruas depois das sete da noite.
Veículos de propaganda rasgam, por vezes, o silêncio das ruas, realçando as vantagens do anunciante.
Os sons dos vendedores ambulantes, porta a porta, também são audíveis. É o vendedor de picolé, com a sua sineta e o chavão “olha o picolé, sorvete”. O vendedor de verduras, de sua bicicleta, grita “cheiro verde, alface e tomate”. No início da noite, o som de um triângulo persistente informa a chegada do vendedor de “chegadim”, cada vez mais raro.
São importantes exemplos de sons que ajudam a contar parte significativa da nossa História.
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SABOREAR A PERIFERIA
As vias públicas sempre foram os principais locais para as interações sociais de uma comunidade. São nelas que encontramos o comércio, o lazer, as manifestações culturais. Em um bairro periférico esse conceito se intensifica, principalmente quando os espaços residenciais são pequenos e a calçada é extensão das moradias. Muitos, hoje, dos comércios de alimentos estabelecidos, começaram com pequenas bancas de comida nas calçadas do bairro. A expressão comida caseira, por exemplo, reporta a talentos culinários na vizinhança que, como um complemento de renda, proporciona sabores e cheiros apreciados e por bons preços. Comer nesse ambiente também significa comer com pessoas familiares e, em geral, iguais e sem maiores constrangimentos.
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CAMINHOS DA PERIFERIA
Muitas cidades no mundo enfrentam uma série de problemas atrelados à mobilidade urbana e também à falta dela. Isso acontece em especial naqueles locais que passaram por um rápido processo de urbanização, marcado pelo crescimento desordenado, isto é, sem qualquer tipo de planejamento que preparasse o espaço para o crescimento populacional, principalmente em uma metrópole no semi-árido nordestino, com constantes migrações forçadas pelas secas, sem esquecer um conjunto de fatores nessas épocas como a falta de terras e investimentos para as famílias interioranas pobres. A periferia, sem investimentos, se ordenou conforme os loteamentos, a ocupação de áreas próximas a rios, lagoas e sem donos. As vias de acesso ao bairro periférico tornaram-se tortuosas, estreitas, sem conservação, gerando lentos deslocamentos. Assim o sistema de transporte público tornou-se ineficiente, gerando um crescimento da frota de carros e motocicletas, que, também, não foi solução definitiva, além de ser para os que mais podiam financeiramente. Ver como isso repercutiu no bairro é o que se pode conhecer nos tópicos desse bloco.